quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Desafio/discussão

"Às transformações económicas e tecnológicas que a Comunidade Europeia impõe ao nosso país, nós respondemos com resistência (sobretudo passiva) que se apoia em velhas estratégias de "inteligência de sobrevivência", que têm décadas, talvez séculos.
Moldadas em estratos inconscientes, elas condicionam os principais reflexos de defesa, constituindo uma verdadeira barreira ao "desenvolvimento".
Por isso o país não se desenvolver realmente, durante estes anos de riqueza que nos foi oferecida de bandeja (claro, com contrapartidas destrutivas, se nada fosse feito). Não operámos nem revoluções radicais na educação (condição primeira de desenvolvimento), nem criámos planos de reorganização da economia, da administração, de reforma fiscal, de investigação científica ou da saúde. Perdemos - estamos a perder - uma oportunidade única. E o  nosso frágil tecido económico esboroa-se dia após dia. Portugal. Arrisca-se a desaparecer.
Assiste-se, neste momento inicial do século XXI, a um esforço desesperado para afirmar Portugal, quer dizer, para que Portugal subsista, inscrevendo-se na Europa.
(...)
No meio da grande perturbação actual que a destruição do país arcaico provoca, agarramo-nos a automatismos afectivos, à tentação da corrupção (esperteza) por velhos hábitos de impunidade de classe, à inércia, ao compadrio (vestígios degenerados da antiga democracia afectiva), enfim não já ao familiarismo, que explodiu como meio envolvente, mas à família desfeita ainda pertinente como ideal imaginário que se remenda todos os dias com a ajuda de psiquiatras, psicólogos, psicanalistas."
(...)
Da pequenez passou-se aos projectos megalómanos (...).
De que tamanho somos, nestes tempos de mudança?"
José Gil, Portugal Hoje - o Medo de Existir, Lisboa, Edições Relógio d'Água, 2004

Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora (adaptado)

Qual pode ser a contribuição dos jovens para a (re)construção do país?

Desafio/discussão

" A entrada de Portugal na União Europeia - de dentro para fora - processa-se, pois, através de mil ambiguidades. No meio da grande perturbação actual que a destruição do país arcaico provoca, agarramo-nos a automatismos afectivos, à tentação da corrupção (esperteza) por velhos hábitos de impunidade de classe, à inércia, ao compadrio (vestígios degenerados da antiga democracia afectiva), enfim não já ao familiarismo, que explodiu como meio envolvente, mas à família desfeita ainda pertinente como ideal imaginário que se remenda todos os dias com a ajuda de psiquiatras, psicólogos, psicanalistas."

José Gil, Portugal Hoje - o Medo de Existir, Lisboa, Edições Relógio d'Água, 2004

Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora (adaptado)

Apresente a sua visão do Portugal do início do século XXI.

Desafio/discussão

Emita a sua opinião sobre a atualidade das críticas de Luís de Camões ao país e aos portugueses, tendo como referência as intervenções do poeta ao longo de Os Lusíadas.


Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora (adaptado)

terça-feira, 23 de agosto de 2011

"A mitificação do herói em Os Lusíadas e Mensagem"

"Os Lusíadas apresentam, assim, um homem que "é a medida de todas as coisas, como defendia Protágoras, numa acepção humanista que se prende com uma determinada visão do mundo: o antropocentrismo, que substitui o teocentrismo medieval e, consequentemente, valoriza a razão em detrimento do dogma. É a apologia da experiência e do saber, e a crença nas capacidades ilmitadas do Homem que, em perfeita consonância com o espírito renascentista, encontramos na epopeia camoniana. A origem da matéria épica é real e enraíza na História de Portugal, construída pelo povo luso, o herói do pema.
[...]
O herói de Mensagem situa-se no domínio da utopia e do esoterismo, do oculto, traduzido no primeiro verso do poema "O Infante" ("Deus quer, o homem sonha, a obra nasce"; - Segunda parte, Mar português), caracteriza-se por uma atitude contemplativa (ao contrário do herói camoniano, que é activo) e não se define enquanto ser individual. Este funciona como um símbolo e constitui-se a partir da própria essência do povo português, à qual subjaz a capacidade de sonhar, determinada por Deus, e de realizar esse sonho, o que contribui para o enriquecimento da alma humana. O herói torna-se um mito, porque "O mito é o nada que é tudo", pois é o mito que cria a realidade "E a fecundá-la decorre" (Primeira parte - Brasão, Os Castelos, "Ulisses").
O herói de Mensagem surge da necessidade de combater a estagnação que caracteriza o Portugal do séculoXX, agrilhoado numa paralisação que se tornara crónica, depois de Camões ter avisado os portugueses do perigo do ócio que "efemina os peitos" ( Canto VI, est. 96, v 4)."

Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora

O que é o mito? Para que serve?

"O mito como elemento fecundador da realidade em Mensagem"

"A obra Mensagem surge como resposta àquilo que Luís de Camões já referira na sua obra Os Lusíadas: o início da dissolução do Império Português, contra a qual tentou lutar através da palavra que serviu a denúncia, das críticas e dos apelos à acção dos portugueses, já então dominados pela inércia, e das exortações finais do rei D. Sebastião.
Fernando Pessoa possuía a perspectiva subsequente ao desmoronamento da alma nacional e soube avaliar o sentimento que, progressivamente, se instalou no inconsciente colectivo português, o saudosismo que nos conduziria, de facto, à inércia gerada por um mito que, durante séculos, alimentou a esperança dos portugueses do regresso de um qualquer salvador da nação, capaz de restituir ao país a glória perdida. É assim que o poeta do séulo XX propõe justamente a substância do nosso passado e o mito sebástico como forma de promover a regeneração de Portugal e de reconquistar uma identidade perdida, não através da construção de um império material, situado num espaço geográfico delimitado por fronteiras, mas profetizando a construção de um império espiritual, um império de união entre todos os povos, caracterizado pela fraternidade entre todos os homens.
[...]
Assim, na obra Mensagem, uma obra épico-lírica, o poeta reúne a memória da nossa História nacional, marcada pelo período áureo a que corresponde o empreendimento dos Descobrimentos, o desaparecimento de D. Sebastião na batalha de Alcácer Quibir e a consequente perda da identidade da nação, que coincide com a perda da independência e instaura, no povo  português, o sentimento saudosista que dá origem ao mito sebastianista."

Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora



Comentem este excerto caracterizando os sentimentos nele expressos em relação à atualidade portuguesa.

"As reflexões do poeta n' Os Lusíadas - o declínio do Império"

"Estas reflexões constituem a visão do poeta renascentista em relação à própria condição humana, o que serve, por vezes, a construção do herói do poema, que supera todas as provações e será premiado pelo seu esforço e valentia, na Ilha dos Amores, espaço simbólico de recompensa pela conclusão de um percurso glorioso.
O poeta revela também a sua perspectiva em relação a uma fase do Império Português e aos valores dominantes no pais, num momento em que o brilho das grandes navegações começava  a ser ofuscado pelo materialismo que grassava no reino, pela indiferença pela arte e pela cultura; o poeta manifesta ainda o seu desalento pelo desprezo a que a sua epopeia era votada."

Fonte: Análise das obras Os Lusíadas de Luís de Camões e Mensagem de Fernando Pessoa, Conceição Jacinto e Gabriela Lança, Porto Editora



À luz deste excerto, qual é a vossa opinião em relação aos temas abordados, transpondo para a atualidade portuguesa?

Sobre a Mensagem

"O assunto da Mensagem não são os portugueses e os seus feitos gloriosos ou os acontecimentos históricos mais significativos, mas a essência de Portugal e a sua missão a cumprir. Diversamente, pois, do que acontece n'Os Lusíadas, em que o tema é a História de Portugal, vista através dos feitos guerreiros e marinheiros dos heróis portugueses, relatados nas paragens da viagem de Vasco da Gama à Índia, fio condutor da epopeia camoniana."

Fonte: Dicionário de Mensagem, Artur Veríssimo, Areal Editores

Fernando Pessoa por Sophia de Mello Breyner

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Poema "Mar Português"









Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nao é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fonte: Manual Página Seguinte 12º ano, Texto Editores

Poema "Horizonte"














Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
'Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa -
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves, flores,
Onde era só, de longe a abstracta linha.

O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp´rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte -
Os beijos merecidos da Verdade.

Fonte: Manual Página Seguinte 12º ano, Texto Editores

Texto de apoio ao poema "O Infante"

"O mar foi descoberto; o império português de quinhentos fez-se e desfez-se. Mas a missão divina de Portugal de que Deus incumbiu os Portugueses, através do Infante D. Henrique, ao sagrá-lo e ao sagrar-nos a nós nele, essa está por cumprir. Mas como esse é o destino manifesto de Portugal, cumprida será quando chegar a "hora", porque essa é a vontade de Deus.
O último verso - "Senhor, falta cumprir-se Portugal !" - é uma prece e uma queixa, ao mesmo tempo: uma prece para que o Quinto Império venha; uma queixa pela demora desse advento."

António Cirurgião, in O Olhar Esfíngico da Mensagem de Pessoa, ICALP

Poema "O Infante"

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

 Fonte: Manual Página Seguinte 12º ano, Texto Editores

Excerto de António Quadros

            "No segundo andamento, com o título de Mar Português [constituído por doze partes correspondendo cada uma delas a um poema], Pessoa quis dar-nos uma radiografia, simultaneamente épica e dramática, do que foi a grandiosa, contudo dolorosa Possessio maris[1] (epígrafe desta II parte). (…)
            Se é este segundo andamento que mais afirma a missão cumprida, como missão divina, é também nele que se nos lembra o seu preço, terrível preço do favor divino, que não é favor aos homens em seu egoísmo ou seus interesses, mas nomeação para o sofrimento em nome da redenção futura, da redenção universal, no paradigma de Cristo. E o tema de um dos mais belos e decerto o mais pungente poema da Mensagem, o que principia Ó mar salgado, quanto do teu sal/ São lágrimas de Portugal?/ Por te cruzarmos, quantas mães choraram,/ Quantos filhos em vão rezaram?/ Quantas noivas ficaram por casar/ Para que fosses nosso, ó mar?
            O poeta interroga: Valeu a pena? E responde, num protesto contra o egocentrismo ou o materialismo burguês satisfeito dos que só pensam em si próprios, retrato talvez do Portugal de hoje, que Fernando Pessoa precisamente quis esconjurar: Tudo vale a pena/ Se  a alma não é pequena."

Fonte: António Quadros (introd., org. e bibliog.), in Mensagem e outros poemas afns,
Publ Europa-América, 1990 (texto adaptado e com supressões)



[1] Possessio maris: [lat.] posse do mar.

Poema "Ulisses"

O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo –
O corpo morto de Deus,
Vivo e desnudo.
Este que aqui aportou,
Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos criou.
Assim a lenda se escorre
A entrar nas realidade,
E a fecundá-la decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.
Fonte: Manual Página Seguinte 12º ano, Texto Editores