"No segundo andamento, com o título de Mar Português [constituído por doze partes correspondendo cada uma delas a um poema], Pessoa quis dar-nos uma radiografia, simultaneamente épica e dramática, do que foi a grandiosa, contudo dolorosa Possessio maris (epígrafe desta II parte). (…) Se é este segundo andamento que mais afirma a missão cumprida, como missão divina, é também nele que se nos lembra o seu preço, terrível preço do favor divino, que não é favor aos homens em seu egoísmo ou seus interesses, mas nomeação para o sofrimento em nome da redenção futura, da redenção universal, no paradigma de Cristo. E o tema de um dos mais belos e decerto o mais pungente poema da Mensagem, o que principia Ó mar salgado, quanto do teu sal/ São lágrimas de Portugal?/ Por te cruzarmos, quantas mães choraram,/ Quantos filhos em vão rezaram?/ Quantas noivas ficaram por casar/ Para que fosses nosso, ó mar?
O poeta interroga: Valeu a pena? E responde, num protesto contra o egocentrismo ou o materialismo burguês satisfeito dos que só pensam em si próprios, retrato talvez do Portugal de hoje, que Fernando Pessoa precisamente quis esconjurar: Tudo vale a pena/ Se a alma não é pequena."
Fonte: António Quadros (introd., org. e bibliog.), in Mensagem e outros poemas afns,
Publ Europa-América, 1990 (texto adaptado e com supressões)